top of page
Writer's pictureO Expoente

Editorial: Precários e isolados



Explorados, precários e mal pagos. É esta a realidade dos jornalistas portugueses. Trabalham horas extraordinárias, que nunca chegam a ser remuneradas, sujeitam-se a contratos injustos e não progridem na carreira. Tudo isto sob o abrigo de um sentido de missão que tudo permite. Para denunciar as injustiças a que outros são submetidos, lá estão eles, de microfone na mão. Contam as histórias de outros, mas esquecem-se da que carregam diariamente.


Os jornalistas esqueceram-se do seu papel, concordaram boicotar conferências de imprensa onde lhes é negado o direito a perguntar, mas, quando estas acontecem, não há um órgão de comunicação social que não se faça representar por um “jornalista-tripé”. É uma desonra para a profissão e uma sujeição a interesses que não são seus. Tudo em nome de um lucro que nunca lhes chega. O prejuízo, esse é de todos. Do jornalista, da sociedade, da Democracia.


Sem escrutínio perde-se a qualidade informativa e tudo isto é agravado quando constatamos que muitas redações sobrevivem à custa de jovens estagiários. Com vínculos menos estáveis ou trabalho a recibos verdes são uma presa fácil nas mãos de grandes grupos económicos.


A precariedade laboral e a falta de experiência levam-nos a ceder a pressões superiores, não levantam ondas e cumprem o trabalho jornalístico como se fossem produtores em série. Exclui-se a reflexão, deixa de existir nuance e as notícias perdem visão e ângulo. Deixam de questionar os superiores com medo de perder a oportunidade de trabalho, até porque nas escolas de jornalismo ensina-se que quem encontra uma porta aberta é um sortudo. Não pode deixar que se feche, ainda que, para isso, tenha de abdicar da sua independência económica, tempo e, muitas vezes, valores. Parte-se do princípio que um jornalista tem de, e deve até, querer pôr a profissão acima de tudo. O tempo livre mistura-se com o trabalho numa grande massa que se torna indissociável.


E reivindicações? Nenhumas. Não há greves nem vozes que se façam ouvir. Falta união e vontade de mudar. Os lamentos e desabafos não podem ser apenas conversa de café. É preciso sair das redações, é preciso deixar a antena sem sinal, é preciso embranquecer as páginas. Mostrar que sem o trabalho dos jornalistas, o país para.


Não é admissível que um jornalista com mais de 20 anos de casa continue a ganhar pouco mais do que o salário mínimo. Não é admissível que um jovem jornalista tenha de aceitar condições miseráveis para poder trabalhar.


A missão não justifica tudo e a meta só se atinge com esforço e organização conjunta. A luta pelos direitos laborais não pode cessar enquanto continuarem a surgir relatos de precariedade. O jornalista não tem de ser rico, mas também não tem de viver na miséria.

Recent Posts

See All

Esta pressa inimiga

Nós temos de nos desfazer desta pressa inimiga que nos consome. O humano e a sua essência inacabam-se na pressa dos dias, na correria...

Comments


bottom of page